Dubas Música comemora três décadas de atuação
Para ler ao som de Jet Samba
Em fins do século passado, mais precisamente, em 1994, quando disco físico, então no formato CD, era a melhor forma de se aplicar de sons e pausas combinados, o selo Dubas Música estreou com uma visão diferenciada. Fossem títulos novos, relançamentos fundamentais ou coletâneas com conceitos bem amarrados, a gravadora independente idealizada por Ronaldo Bastos fez muito. E continua. Hoje, a partir das 19h, no Circo Voador, comemora três décadas de atuação.

Também celebra o relançamento em vinil de um álbum icônico de seu catálogo e na obra de Marcos Valle, “Jet Samba”, disco instrumental que completará 20 anos em 2025.
Motivos de sobra para festejar, em noite que terá show de Marcos Valle e convidados, incluindo Rashid e Sandra de Sá, e os DJs Marcelinho da Lua e Alive Pop-up.
Mais sobre a Dubas e o Dubas, em dois textos antigos. O primeiro, que reproduzo abaixo, foi feito por encomenda para o livro “Onda Infinita: We see music / Waves of timeless modern sounds and design” (Zahar), edição bilíngue brasileira-inglesa lançada na virada para 2014, quando a gravadora completava duas décadas de atuação.
O segundo, em 20 de junho de 1994, para “O Globo”, anunciava o nascimento da Dubas Música e o lançamento de “Sorte”, primeiro álbum da dupla Celso Fonseca & Ronaldo Bastos – o autor de letras e conceito visual dividindo crédito com o cantor, compositor, guitarrista/violonista, produtor.
“Ouvir com os olhos
Sons para ouvir e ver. Esse poderia ser um slogan para definir os discos lançados pela Dubas Música na última década e meia, numa estética que já em seus primeiros passos se tornou referência. Musicalmente, é um catálogo diversificado, com novos artistas ou clássicos, reedições de discos fundamentais, coletâneas temáticas, e que erm seu passeio por diferentes gêneros propõe um recorte moderno e cosmopolista da música brasileira. Conceito acompanhado pela identidade visual/gráfica de seus discos, fruto da parceria estabelecida com o escritório/coletivo de design 6D.
Essa é uma concepção que o compositor e produtor Ronaldo Bastos já imprimira em trabalhos anteriores à criação de seu selo, atuando nos anos 70 e 80 como uma espécie de “ideólogo” conceitual e visual de álbuns emblemáticos de Milton Nascimento, Beto Guedes, Lô Borges, João Penca e seus Miquinhos Amestrados, Luiz Melodia, Arrigo Barnabé. Conceito que se completou e ganhou corpo junto ao produtor uruguaio Leonel Pereda na Dubas e à dupla Beto Martins e Emílio Rangel da 6D.
Esse núcleo criativo se expande numa rede que passa por compositores, intérpretes, produtores, técnicos envolvidos na criação da música e por artistas plásticos, fotógrafos, designers, gráficos, assim como as referências estéticas e culturais de cada projeto.

Para a série de compilações “Bossa nova lounge” (atemporal passeio com Jobim, Donato, Deodato, Baden, Valle, Walter Wanderley, Quarteto em Cy, Wanda Sá, Joyce, Os Gatos…), por exemplo, estão a sinuosa paisagem e a moderna arquitetura do Rio, incluindo aquelas vistas de seus melhores ângulos, a do MAC que Oscar Niemeyer pousou em Niterói. Para “Fino Coletivo”, o disco de estreia do grupo carioca homônimo, a apropriação (devidamente creditada) da obra de intervenção urbana “Ônibus incendiado”, placa de metal que o artista plástico Guga Ferraz espalhou pelo Rio em 2003. Para outra série, “Revisitados”, que foca períodos e conceitos de cada artista, uma homenagem a Milton Glaser e seu portrait de Dylan, revisitado nos de Bethânia, Chico, Gil, Jorge Ben, Alcione… Para o conjunto de obra reunido na série Colecionave os retratos dos artistas (Fernando Brant, Torquato Neto) quando jovens. Para as reedições, pontuais intervenções ou correções e cirurgias radicais – caso da capa original do disco de Sergio Mendes & Bossa Rio em 1964, que vira o ponto de exclamação do título “Você ainda não ouviu nada!” no envelope de sua primeira edição em CD , em 2002. Para “Liebe Paradiso”, o disco de Celso Fonseca, Ronaldo, Leonel, Duda Mello e duas dúzias de participações que se alternam, uma foto que Cafi fez no México décadas antes.
A parceria entre arte gráfica e sonora ganha força no início dos anos 1950, quando entram em cena os discos em 33 1/3 rotações por minuto. Começa a era dos LPs de vinil, com 10 ou 12 polegadas – estes, com medida de 30cms por 30cms, estabeleceram o padrão que vigorou até fins dos anos 80. Selos de jazz da década de 50, como Impulse e especialmente Blue Note, estão entre os pioneiros de uma linha estética definida, muito além do recurso fácil de estampar o carão do artista na capa.
No Brasil, nos anos 1960, o trabalho do artista gráfico César Villela nos discos da bossa nova e da gravadora Elenco (criada pelo produtor Aloysio de Oliveira) é outra referência decisiva. E uma das influências assumidas pela dupla Dubas/6D, que, em 2004, teve a oportunidade de trocar figurinhas com seu mestre na recriação da capa de “It might as well be spring”, disco de Sylvia Telles lançado pela Elenco em 1965. A arte original desse álbum era uma das raras pedras no sapato do perfeccionista Villela, que, quase quatro décadas depois, se juntou aos “6Ds” Beto Martins e Emílio Rangel para finalmente encontrar a solução ideal.
Ainda nos anos 60, o design para os discos de rock – com os Beatles na vanguarda, a partir de “Rubber soul” em 1965 e, principalmente, “Sgt. Pepper” em 1967 – reafirmou o status de arte que o setor atingiu.
De volta ao futuro, além de encontrar a sua identidade, o trabalho desenvolvido por Dubas/6D virou referência. Discos que tocam antes de soar, de uma gravadora que tem estilo e cara. É o que “ouviveremos” nas páginas a seguir”.
PS: reproduzo, sem revisar num primeiro momento, o arquivo que enviei para os editores de “Onda infinita”. É possível que tenha alguma diferença em relação ao que foi impresso.
PS3 (que vem antes do 2): tirei o recado que deixara para o curador da Dubas e mais dois detalhes.
PS2: sobre os textos para o Segundo Caderno, jornalisticamente, para cavar espaço, explorei a então discordância de Dubas com Bituca, como se percebe já a partir do título na reportagem que recortei e colei.


