ARTE E AJUDAR

Por Jorge Luiz

À guisa de apresentação, Jorge tem sido um interlocutor frequente, via troca de mensagens ou em conversas telefônicas. Bacharel em Artes Plásticas pela UDESC (Universidade do Estado de Santa Catarina) e mestre em Artes Visuais, na linha de História, Teoria e Crítica de Arte,  pela USP (Universidade de São Paulo), escreve sobre arte e cultura. Ele estreia na AmaJazz com um manifesto sobre a arte em tempos de algoritmos e Inteligência Artificial. Artistas sendo felinos, segundo a leitura de “Os Saltimbancos” (a peça infantil que Chico Buarque fez a partir da original italiana de Sergio Bardotti), como a fala antes da reprise da canção “Bicharia”, no fim do disco, sugere:  “Quanto à gata hum, bem, a gata, a gata pra falar a verdade (…), mas mantém a gente alegre. De noite ela se espicha na almofada e canta um bocado de coisa bonita pra gente. Ela sim virou realmente uma su… uma su…, como é mesmo?, uma superstar”    (Antônio Carlos Miguel)

Os bons artistas ajudam. Como? Fazendo arte boa. Quando a arte é boa, ela ajuda enquanto arte. Ponto. 

O artista não precisa se vestir de Papai Noel e descer a chaminé – só se for para ficar entalado, como naquele antigo conto, pois será engraçado, e nesse caso o artista em questão será um humorista. 

O artista não precisa expiar a culpa de ser artista num mundo ruim porque a boa arte é sua paga. Fazendo arte boa, ele expia automaticamente a culpa. Ah, mas o artista não vende. Ah, mas a arte dele não circula. Bobagem. Um único poema, lido por uma única pessoa: se a essa pessoa ajudar, a arte está paga. Sendo bom, o poema fará bem à pessoa, mesmo que a uma única, e o artista estará livre de culpa e com lugar garantido, não no céu, mas na terra.

Arte, como a vemos, ou é comunicação ou é produto. Enquanto comunicação, a arte independe do aparelho que a difunde, que pode ser limitado à boca e memória humanas. Assim a arte vai do olho à memória, da memória à boca, da boca ao ouvido de outra pessoa. Indústria cultural nenhuma e nem a mais cruel ditadura podem destruir isso. A boa arte, aquela que é entendida como boa por alguém que assim a reconhece, é inesquecível e indestrutível.

Somente erradicando todos aqueles que consideram esta arte boa boa, e apagando ainda todos os traços materiais dela, seria possível erradicá-la. Ainda assim, algo restaria: uma memória difusa na cabeça daqueles que não foram eliminados por tal ou qual cruel sistema. Pior ainda: a extrema crueza da operação necessária à extirpar a boa arte em questão causaria enorme interesse e comoção, provocando talvez um renascimento, uma revolta, uma tomada de posição contrária maior ainda.

Cabe a nós, como seres humanos conscientes, preservar E transmitir – não basta somente uma coisa, nem somente a outra – toda a arte a que consideramos boas.

Ao artista cabe manter-se bom, isto é: manter-se produtivo, zelar pela qualidade da própria arte, sabendo que ninguém mais zelará. (Jorge Luiz)

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