Por enfrentar o fascismo franquista, García Lorca foi assassinado. Ben Sidran em The Concert for García Lorca prova que o poeta permanece vivo
Para ser lido ao som de Ben Sidran em The Concert for García Lorca
“Você conhece a história”, diz o compositor Ben Sidran, então com 55 anos e recordando um fato ocorrido em 1936, sete anos antes de seu nascimento. A história é o assassinato do poeta espanhol Frederico García Lorca e o local onde se desenrolam os acontecimentos é exatamente onde Sidran está sentado quando começa essa narrativa, a casa do poeta, em Granada, na Espanha. Sidran está lá para gravar um concerto em homenagem aos cem anos do nascimento do poeta.
Na gravação, segue Sidran, o relato se aprofunda ao descrever as últimas horas de vida do dramaturgo, compositor e poeta: “Apenas alguns dias antes de Garcia Lorca ser preso, eles vieram a esta casa”. Provavelmente, imaginavam os soldados franquistas, naquele lugar estaria escondido algum material subversivo. Nada foi achado, o que não impediu que a milícia – frustrada e revoltada – destruísse alguns objetos pessoais de Lorca. E preparasse um ataque ainda pior.
Alguns dias depois, os mesmos soldados voltaram. Agora, sem perguntas, levaram Lorca a um olival perto de Fuente Grande, o mesmo local que os árabes que naquela região viveram séculos antes haviam batizado de “A Fonte das Lágrimas”. Lorca foi então assassinado.
O que Sidran narra musicalmente são os acontecimentos de 16 de agosto de 1936, quando García Lorca foi retirado à força da casa de amigos, em Granada, em uma grande operação do governo que cercou todo o quarteirão. Segundo seu biógrafo, o historiador Ian Gibson, Lorca era acusado de “ser espião dos russos, estar em contacto com estes por rádio, ter sido secretário de Fernando de los Rios (ideólogo socialista espanhol) e ser homossexual”.
Lorca nunca mais seria visto com vida. A data exata de sua morte foi objeto de uma longa polêmica, mas parece definitivamente estabelecido que ele foi fuzilado dois dias depois, às 4h45min da madrugada do dia 18 de agosto, no caminho que vai de Víznar a Alfacar. Seu corpo jamais foi encontrado – foi deixado numa vala comum.

The Concert for García Lorca, O Concerto para García Lorca, de Ben Sidran – gravado na Espanha, terra natal do falecido poeta – se destaca na obra de um músico criativo e original.
Pianista, compositor, cantor americano, nascido em Illinois, Chicago, em 1943, Sidran é, por exemplo, também escritor e autor do livro (nunca lançado no Brasil) There was a Fire: Jews, Music and the American Dream (algo como Havia um Fogo: Judeus, Música e o Sonho Americano). O livro foi lançado nos Estados Unidos em 2012 e, em síntese, o autor defende uma tese das mais interessantes: Sidran tenta explicar como e por que 2% da população dos Estados Unidos são responsáveis por 80% da produção musical do país. A estimativa algo hiperdimensionada é dele, mas tem muito de verdade. Antes do rock, por exemplo, entre os grandes compositores, Cole Porter era exceção. Os demais – nomes como Ira & George Gershwin, Irving Berlin, Richard Rodgers & Lorenz Hart (& Oscar Hammerstein II), Jerome Kern, Harold Arlen… – integravam uma lista de gênios musicais judeus.
Se soube mapear a trajetória musical dos judeus na América, Sidran soube também compreender a grandeza poética e revolucionária de Lorca. Seu disco é respeitoso e inteligente. Tão inteligente que Sidran se permite ser irônico com a ignorância dos que foram capturar Lorca: “Eles estavam procurando por um transmissor de rádio que pensaram que ele havia escondido dentro deste piano. Eles pensaram que ele estava usando para se comunicar com os comunistas na Rússia. Eles foram tão estúpidos: ele não o estava usando para se comunicar com os russos. Ele se comunicava com os cubanos, com os americanos, com os franceses, com os ingleses, com os japoneses, com os chineses, com pessoas de todo o mundo. E ele não precisava de um transmissor de rádio”.
E conclui: “Ele tinha sua arte”.

Excelente! Fascinante esta historia. Abriu uma vontade de conhecer mais a historia de Lorca (ja ando lendo muito sobre fascismo na Europa antes e durante a Segundo Guerra) .e vou attaz do concerto para Lorca de Sidran. Amajazz é cultura e como sempre Marcio Pinheiro acertou no alvo.