Antônio Carlos Miguel lembra que Rita Lee, muito além do rock, escancarou as portas para diferentes gerações de cantoras e compositoras brasileiras
Antônio Carlos Miguel registrou a turnê Refestança, shows que percorreram
oito capitais brasileiras e deram origem a um disco ao vivo
Rita Lee se foi, mas, clichê verdadeiro, continua. Através de uma obra admirável e fundamental para a canção brasileira. Ela tem lugar garantido em qualquer lista dos grandes compositores de todos os tempos e lugares. Sempre mutante, como uma Chiquinha Gonzaga do rock brasileiro, escancarou as portas para diferentes gerações de cantoras e compositoras brasileiras. Sem Rita não existiriam da forma como conhecemos Angela Ro Ro, Marina Lima, Paula Toller, Cássia Eller, Zélia Duncan, Fernanda Takai, Ana Carolina, Marisa Monte, Cris Braun, Pitty, Érika Martins, Juçara Marçal, Tamy, Letrux, Teresa Cristina, Ludmilla, Luedji Luna, Xênia França….
Rita também muito além do rock, como, em 1980, João Gilberto tratou de provar, chamando-a para cantar Lamartine Babo (Joujou Balangandãs) num especial para a Globo. Nessa época, ao lado do marido e parceiro Roberto de Carvalho, ela já tinha se reinventado, ou melhor, inventado seu “rockcarnaval”, com a série de marchinhas-disco que sacudiram pistas a redor do mundo. Lança-Perfume, Chega Mais, Mania de Você, Baila Comigo… Essa vertente para animar qualquer salão foi reativada até na breve parceria com Ed Motta, em pelo menos dois clássicos, Fora da Lei e Colombina.
No início dos 70, ejetada dos Mutantes por, entre outras razões, o machismo e o então fervor progressivo dos irmãos Arnaldo e Sérgio Dias Baptista, a irreverente e sempre musical sem fronteiras Rita foi muito além. Roqueira mesmo, até com cara de bandida em suas primeiras tentativas solo. Incluindo as Cilibrinas do Éden (dupla com Lúcia Turnbull que fez, em 1973, um álbum até hoje inédito) e o grupo Tutti Frutti (com quatro discos hoje clássicos, lançados entre 1974 e 1978). Em fins de 1977, já com Roberto de Carvalho, também comemorou os dez anos do encontro com Gilberto Gil na Tropicália com a turnê Refestança, em show que percorreu oito capitais brasileiras e virou um disco ao vivo. São dessa época as fotos que fiz e divido aqui. A irreverente-iconoclasta Santa Rita de Sampa que partiu na noite de ontem fica como a melhor tradução de um Brasil no qual cabem pitadas de tudo, do bolero à disco music, da bossa ao rock, do caipira ao techno.




