Paul de tempos em tempos e, agora, na Era do Aquecimento Global

Enquanto se prepara para cobrir mais um show do sempre Beatle, Antônio Carlos Miguel pergunta se a morte da fã de Taylor Swift servirá de alerta

A morte da fã de 23 anos, nessa sexta-feira, 17 de novembro, na estreia da turnê brasileira de Taylor Swift no Rio, deverá servir de alerta. Se é que ainda precisa de algum. Nada trará de volta Ana Clara Benevides Machado, mas, para evitar tantas outras fatalidades, governos, produtores, artistas, técnicos e demais envolvidos terão que adicionar muitas providências para enfrentar a imprevisibilidade climática. O novo normal é anormal e quase sempre catastrófico. E pensar que, um ano atrás, o negacionismo quase foi reeleito por aqui. E que, hoje, ainda tem chances entre nuestros hermanos argentinos.

Em 1990, um dos fatores decisivos para a concretização de Paul in Rio foi o engajamento do sempre Beatle às causas ambientais. É informação que veio do produtor deste (e dos, até agora, 25 outros shows de McCartney no Brasil), Luiz Oscar Niemeyer, em seu livro Memórias do Rock. Na época, a política e a economia brasileiras conseguiam ser mais imprevisíveis do que o clima e, com a decretação, em 16 de março, do Plano Collor, os dois shows, previstos para 19 e 21 de abril, contratados meses antes, quase foram cancelados. Sem dinheiro, patrocinadores (assim como todos brasileiras e brasileiros) pularam fora e, após muitas negociações, o então prefeito Marcello Alencar assumiu o compromisso desde que a produção da turnê reduzisse o cachê em US$ 1 milhão. É aí que entra o Paul engajado, como lembrou Niemeyer (e este batucador de Mac registrou):

“A turnê era ligada à organização Friends of the Earth, que tinha entre suas pautas a preocupação com a defesa da Amazônia. Paul queria muito incluir o Brasil no roteiro. Durante a conversa, ele e Linda perguntaram bastante sobre as questões ambientais, falaram sobre o trabalho de Chico Mendes, o líder seringueiro e ambientalista morto um ano antes, mostravam estar bem informados sobre tudo nessa área. Paul também sabia da história do Maracanã, então ainda o maior estádio de futebol do mundo,  algo que reforçava o seu interesse em fazer ali o show no Rio.”

Agora, 33 anos depois, o mesmo (ou quase, desfigurado para abrigar a Copa de 2014) Maracanã está agendado para fechar, em 16 de dezembro, a turnê Got Back. A estreia da perna brasileira será em 30 de novembro, no Mané Garrincha (Brasília) e, entre a antiga e a atual capital federal, Paul McCartney também se apresentará  duas noites em BH (dias 3 e 4 de dezembro, na Arena MRV), três em São Paulo (dias 7, 9 e 10 de dezembro, no Allianz Park) e uma em Curitiba (dia 13 de dezembro, no Estádio Couto Pereira). 

Após a que poderá ser a última turnê mundial, ele irá cravar 34 apresentações no Brasil. Um recorde imbatível entre artistas do primeiro escalão do pop. Só falta incluir “Asa Branca” no roteiro.

Tragédia de fã de Taylor Swift à parte, Macca volta ao Brasil escaldado. Ou batizado pelo início complicado. Naquele início de mais um outono carioca, cinco dias de chuvas torrenciais obrigaram a transferência da estreia. Prevista para a noite de quinta-feira, teve que ser jogada para o dia que seria de folga, na sexta. Já o show de sábado no Estádio do Maracanã, 21 de abril de 1990, 33 anos depois, continua no Guinness Book of Records como o de maior público pagante para um artista só: 184 mil ingressos vendidos.

Desde a despedida dos Wings, em 1979, que Paul não se apresentava ao vivo. Afastamento que, de alguma forma, também se prolongou devido ao assassinato de John Lennon, em dezembro de 1980. A volta, a partir de setembro de 1989, na Noruega, foi a primeira Paul McCartney World Tour. Desde então, com exceção dos anos da Covid, ele não saiu mais da estrada, mantendo uma fórmula vencedora: algumas pérolas de seu repertório solo e muitas dos Beatles, incluindo as canções que o grupo nunca mostrara ao vivo. Como sabemos, após Revolver, o único show foi o no telhado de Abbey Road, registrado no filme e disco Let it Be.

Agora, em Voltou, da banda de 1990 resta apenas o tecladista Paul  “Wix” Wickens. Os demais músicos, no entanto, já estiveram com Paul no Brasil em outras oportunidades: Brian Ray (baixo e guitarra), Rusty Anderson (guitarra) e Abe Laboriel Jr (bateria).  Um quinteto tentando e conseguindo recriar o espírito daquele quarteto de Liverpool. E, com a lembrança de alguns dos 26 brasileiros, posso garantir que funciona bem para qualquer um que foi seduzido pela música de Paul (e John, George, Ringo). Bem mais do que em Now and Then. Esta, canção, que, mesmo com toda a ajuda da IA, não passa de um factoide.

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Autor: Antonio Carlos Miguel

Amador de música desde que se entende por gente. Jornalista, fotógrafo especializado no mundo dos sons combinados.

2 pensamentos

  1. Sobre a trajetória dos shows deste grande músico chamado Paul McCartney, tudo bem colocado e nada a acrescentar. Só me faltou a compreensão para a ligação política de passagem, no início do texto, quanto ao negacionismo, que me parece não ter uma ligação direta com as mudanças climáticas que sempre existiram e que, de uns tempos para cá, se fazem mais presentes, com impactos maiores porque as suas consequências atingem mais pessoas, face ao aumento da população mundial e a consequente urbanização, de forma ordenada ou não, de áreas cada vez maiores, sem uma análise mais precisa dos impactos ambientais que possam decorrer de tais ocupações, por falha a começar do indivíduo, despreparado para este assunto, quanto também pelos órgãos do Poder Público que, estes principalmente, deveriam atuar no sentido de evitar tais ocupações. E estas mudanças climáticas não encontram responsabilidades no pensamento político de direita ou esquerda, uma vez que se fazem presentes em todo o planeta, mas com certeza o Brasil, que ainda detém uma floresta enorme, onde caberiam vários países europeus, está longe de ser o seu responsável. Temos uma matriz energética muito menos poluidora do que a dos países desenvolvidos, ditos do primeiro mundo. Com relação ao falecimento da jovem no recente show no estádio Nilton Santos, deve servir principalmente de alerta aos pais e aos próprios jovens que se submetem a viagens longas, dormem de um dia para o outro nas portas dos estádios ou chegam pela madrugada, consequentemente não se alimentando direito e nem se hidratando convenientemente, principalmente nos dias mais quentes, porque os jovens, no firme propósito de verem de perto os seus ídolos, não tomam os cuidados mínimos preventivos quanto a saúde e também segurança. Coisa de jovens, às vezes com consequências pesadas, a lamentar. Mas o que poderia ser feito para evitar tais acontecimentos? E quando a saúde da pessoa, jovem ou não, não tem a mesma disposição para o enfrentamento de situações atípicas como essas que esses jovens enfrentam para assistir aos shows de seus ídolos? Nada estaria sendo comentado se o coração desta moça tivesse resistido. Estaremos livres da repetição de algo assim nos shows do Paul McCartney em nosso território? O que então precisaria ser feito? Se der certo nada se comentará, salvo a qualidade dos espetáculos. Se der algo errado será preciso associação ao negacionismo?

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